Dois estudos recém-publicados investigam a possibilidade instigante de que um dia poderemos desfrutar das vantagens da prática de exercícios com a ajuda de uma pílula, ao invés de suarmos a camisa. Porém, embora alguns pesquisadores acreditem na promessa de uma pílula de exercícios, não se sabe se isso seria prudente.
O mais encorajador dos novos estudos, publicado na semana passada pelaNature Medicine, é a continuação de um estudo de grande proporção publicado no ano passado pela Nature. Naquele estudo, uma equipe do Instituto de Pesquisa Scripps, em Júpiter, na Flórida, revelou que um composto criado por eles e injetado em ratos obesos aumentou a ativação de uma proteína chamada REV-ERB, conhecida por controlar parcialmente o ritmo cardíaco e os relógios biológicos dos animais. Os animais que receberam o composto emagreceram mesmo com uma dieta rica em calorias e melhoraram os níveis de colesterol no sangue.
Inesperadamente, os animais também começaram a consumir mais oxigênio durante o dia e gastaram cinco por cento mais de energia do que os ratos que não receberam o tratamento, muito embora não estivessem se movendo mais que os outros animais. Na verdade, em boa parte dos casos os animais que receberam o medicamento estavam fisicamente mais preguiçosos e inativos do que antes de receberem a droga. Aparentemente, o composto fornecia um exercício sem a necessidade do esforço físico.
Intrigados, os cientistas do Scripps, em parceira com pesquisadores do Instituto Pasteur, da França, e outras instituições, tentaram descobrir o que composto poderia fazer aos músculos para obter esses resultados. Eles sabiam que a droga aumentava a potência da proteína REV-ERB, mas ninguém sabia o que a proteína faria aos músculos diretamente. Por isso, eles começaram a desenvolver uma linhagem de ratos incapazes de expressar um volume muito grande de REV-ERB nas células musculares.
Esses animais demonstraram ser verdadeiros antiatletas. Uma das marcas registradas dos exercícios aeróbicos é que os músculos aumentam o número e o vigor das mitocôndrias, as estruturas celulares responsáveis por gerar energia e consumir oxigênio. Porém, nos músculos desses animais o número de mitocôndrias era baixíssimo.
Por consequência, os animais tinham uma capacidade máxima de consumo de oxigênio 60% mais baixa que o normal. Eles chegavam à exaustão na esteira muito antes das cobaias não afetadas.
Porém, quando os cientistas aplicaram o composto em células musculares isoladas dos ratos deficientes em outra parte do experimento, as células começaram a produzir muito mais REV-ERB. Em seguida, essas células passaram a produzir muito mais mitocôndrias e a fortalecer as existentes.
Por fim, os cientistas injetaram o componente em ratos sedentários para estimular a produção de REV-ERB além dos níveis considerados normais. Quando soltaram os ratos sedentários em pequenas esteiras, eles correram "significativamente mais tanto no quesito tempo, quanto no quesito distância", se comparados a animais que não receberam o composto, afirmaram os autores, mesmo que não tivessem treinando anteriormente.
O medicamento "certamente parece agir como uma mímica do exercício", afirmou o coautor Thomas Burris, atual diretor do departamento de Ciência Farmacológica e Fisiológica da Faculdade de Medicina da Universidade de St. Louis. Ele acrescentou que não é difícil imaginar um medicamento que permita que as pessoas, especialmente com deficiências físicas ou incapacitadas de se exercitarem, de tirar proveito dos benefícios da resistência física, sem precisarem se cansar para isso.
Porém, ainda estamos longe disso e muitas perguntas precisam ser respondidas. Ainda não se sabe, por exemplo, se é possível aumentar os níveis de REV-ERB em pessoas saudáveis, nem se atletas poderiam usar a droga para se doparem. Burris afirmou que outros cientistas que publicaram dados sobre as possíveis pílulas de exercícios o alertaram para "esperar alguns telefonemas estranhos" de atletas e equipes de apoio.
A maior preocupação é saber se uma pílula seria capaz de replicar os efeitos fisiológicos complexos dos exercícios físicos, nem se haveriam consequências inesperadas caso recriássemos os efeitos.
Essa questão serviu de pano de fundo para outro estudo, publicado este mês pelaPLoS Biology. Nele, cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, tentaram replicar estudos anteriores que demonstram que grandes doses de resveratrol, a substância química encontrada em abundância nas cascas de uva, aumenta a produção de novas mitocôndrias em células musculares isoladas, imitando o efeito de exercícios aeróbicos. Depois desses primeiros estudos, o resveratrol também passou a ser visto como uma alternativa farmacológica à prática de exercícios.
Entretanto, o novo estudo acaba com essa esperança. Quando os cientistas alimentaram ratos e camundongos com níveis toleráveis de resveratrol na ração, os animais não produziram mais mitocôndrias nas células musculares. Somente doses extremamente altas de resveratrol levaram à produção de mais mitocôndrias.
Infelizmente, doses exageradas dessa substância têm um efeito tóxico, afirmou o Dr. John O. Holloszy, coautor do estudo e professor de medicina da Universidade de Washington. Ela "envenena dois dos passos" envolvidos na função mitocondrial saudável, afirmou Holloszy.
Ainda assim, o sonho de saúde sem esforço continua a encantar.
"Eu sei que há muita gente que iria preferir tomar uma pílula, ao invés de correr alguns quilômetros", afirmou Burris.
Entretanto, ele acrescenta que o principal objetivo de sua pesquisa e de outras similares é o de ajudar quem não pode se exercitar, não quem se nega a fazê-lo, e que até mesmo os beneficiários seriam enganados.
"O exercício traz tantos benefícios" e "nenhuma droga" é capaz de recriar todos, concluiu.
Isso significa que uma boa pedalada ou algumas horas na piscina jamais serão reduzidas a uma pílula.
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